Religião

  • A Igreja Greco-Católica Ucraniana
A Igreja Greco-Católica Ucraniana, ou simplesmente Igreja Católica Ucraniana, foi a primeira igreja cristã na Ucrânia, fundada em 988 d.C. É uma igreja que participa fui júris, da Igreja Católica, e segue o rito Bizantino. Estima-se que atualmente conte com cerca 6 a 10 milhões de fiéis, boa parte da Ucrânia. Há no Brasil 246 igrejas greco-católicas.  Em Curitiba localiza-se a sede da Eparquia São João Batista. São várias as congregações. As Irmãs Servas de Maria Imaculada completam 100 anos de existência no Brasil. A Igreja Greco Católica tem uma pastoral da juventude que tem por finalidade atingir principalmente os jovens das comunidades ucranianas.
  • Igreja Ortodoxa
A Igreja Ortodoxa possui praticamente a mesma doutrina que a Igreja Católica, com diferenças apenas organizacionais, mas a doutrina é muito semelhante, pois se preserva os Sete Sacramentos, o uso de vestes litúrgicas e o respeito a ícones. A Igreja Ortodoxa e Católica já chegaram a atuar juntas, mas no século XI elas se separaram, e desde então a Ortodoxa não reconhece dogmas proclamados recentemente pela Católica, e não aceita a autoridade do Papa.
O Rito Ucraniano e as Igrejas Orientais
Iván Kindra
Publicado em Campo Magro – Paraná, 2008. E-mail do autor: ivankindra@gmail.com. Ilustração: Catedral São João Batista, da Igreja Ucraíno-Católica, em Curitiba – Paraná (desenho do autor).
Introdução
Espero que este trabalho seja de alguma utilidade a todos que se interessam pelo rito ucraniano e pelas Igrejas Orientais, apesar de destinar-se basicamente aos ucranianos do Brasil, tanto católicos quanto ortodoxos, pois nós, como irmãos, precisamos nos conhecer mutuamente, reduzindo o distanciamento e a repulsa, e aumentando o amor e a fraternidade cristã, para concretizar a vontade de Cristo para que “todos sejam um” (Jo 17, 21).
Também deixo patente que este não é um trabalho científico, mas antes um “panfleto publicitário”, em que apresento tanto dados objetivos quanto a minha visão “emotiva” sobre o assunto, fruto do grande amor que tenho pela Igreja Ucraniana. Assim sendo, o meu objetivo, além de promover o conhecimento sobre o rito ucraniano e as Igrejas Orientais, é também incentivar o amor dos ucranianos pela sua própria Igreja, pois ninguém ama o que não conhece!
No entanto, como as pessoas seguidamente cometem alguns equívocos ao tratar da questão religiosa – comecemos por rever o significado de alguns termos básicos:
RELIGIÃO. – Um conjunto determinado de crenças, dogmas, práticas e cerimônias; uma doutrina que define a relação do homem com Deus, por ex.: a religião cristã. Neste sentido, também se utiliza a palavra fé, por ex.: a fé cristã. Considera-se que a palavra religião venha do verbo latino religare – religar, significando uma doutrina que busca religar o homem com Deus que o criou.
IGREJA. – Uma comunidade ou instituição religiosa; um conjunto de fiéis que professam os mesmos princípios religiosos e se subordinam à mesma autoridade eclesiástica; neste caso, a palavra geralmente é grafada com “i” maiúsculo. A palavra igreja também é utilizada no sentido de templo, isto é, edifício destinado a cerimônias religiosas.
CATOLICISMO. – Quando se pergunta a um brasileiro qual é a sua religião, então a maior parte responde: católica, isto é, religião católica, ou catolicismo. No entanto, o catolicismo não é propriamente uma religião, mas apenas uma corrente ou ramo do cristianismo, este sim uma religião. O catolicismo é uma Igreja Cristã, isto é, uma comunidade cristã, unida em torno da autoridade do Papa e espalhada por todo o mundo. A palavra católico, de origem grega, significa universal. Isto significa que o catolicismo é destinado a todo o universo, a todo o mundo.
CRISTIANISMO. – É a religião cristã, isto é, baseada no que foi ensinado por Jesus Cristo. Em outras palavras, cristianismo é a religião cujo elemento de re-ligação do homem com Deus é Jesus Cristo. Neste sentido, também podemos dizer: a Igreja de Cristo.
Surgido na Judéia, o cristianismo foi inicialmente difundido pelos Apóstolos no Oriente Médio e na região do Mediterrâneo. Os Apóstolos foram os principais discípulos de Cristo. O maior deles foi São Paulo, apesar de não ter conhecido pessoalmente a Cristo. Ele pregou na Ásia Menor, na Grécia e na Itália, onde morreu. O primeiro Papa e Bispo de Roma, isto é, chefe da Igreja em Roma, foi São Pedro. Depois de ter sido muito perseguido, o cristianismo tornou-se a religião oficial do Império Romano sob o governo de Constantino I, a partir do Édito de Milão, no ano 313.
Na Idade Média o cristianismo expandiu-se por muitos países. Entretanto, desde 1054, o cristianismo tradicional está dividido entre orientais ou bizantinos, que basicamente formam a Igreja Ortodoxa, e ocidentais ou latinos, que formam a Igreja Católica. No entanto, vários agrupamentos orientais, não só ortodoxos, mas também monofisistas e nestorianos, voltaram a unir-se com Roma, mantendo porém o seu próprio rito, e atualmente constituem as Igrejas Orientais Católicas, entre as quais está a Igreja Ucraíno-Católica, como dizemos no Brasil, ou Igreja Greco-Católica Ucraniana, como é chamada na Ucrânia.
No decorrer da história também houve muitas heresias, isto é, desvios da doutrina cristã, sendo que as principais são:
Arianismo – doutrina de Ário negando a divindade de Cristo e condenada nos concílios de Nicéia (325) e Constantinopla (381).
Nestorianismo – doutrina de Teodoro de Mopsueste difundida por Nestório, segundo a qual se deve distinguir em Jesus Cristo duas pessoas, assim como se distingue duas naturezas, e cujos adeptos romperam com o cristianismo tradicional no Concílio de Éfeso, em 431. O nestorianismo está hoje reduzido a pequenas comunidades: a Igreja Assíria ou Caldéia (com sede no Iraque) e a Igreja do Malabar, na Índia. Convém ressaltar que cada uma destas Igrejas tem hoje o seu “braço” católico, isto é, existem Igrejas Orientais Católicas que delas provêm.
Monofisismo – doutrina que reconhece em Cristo apenas a natureza divina e cujos adeptos não aderiram às formulações do concílio de Calcedônia, em 451, dando origem às chamadas Igrejas monofisistas “não calcedonianas”: a Igreja Copta do Egito (Alexandria), a Igreja da Etiópia, as Igrejas sírias monofisistas (jabobitas, malabaritas), e a Igreja Armênia. Todas têm hoje o seu “braço” católico.
Iconoclasmo – movimento que, no Império Bizantino, combatia o uso de ícones (imagens sacras) como se fosse idolatria (séculos VIII e IX). A palavra provém do grego eikon, imagem + klasmos, quebrar. Esse movimento só terminou em 843, com a reintrodução solene dos ícones na igreja de Santa Sofia, comemorada pelos bizantinos em geral, tanto ortodoxos quanto católicos, no primeiro domingo da Grande Quaresma, como Dia da Ortodoxia.
No século XVI surgiu o protestantismo, também iconoclasta, separando-se da Igreja de Roma, a qual promoveu a Reforma Católica no século XVII, para evitar a sua decadência.
A partir do século XVIII, o cristianismo em geral teve que lutar contra o crescimento do racionalismo, filosofia baseada na razão, no domínio do conhecimento, que descristianizou a sociedade. Entretanto, graças às missões, o cristianismo espalhou-se por todas as partes do mundo, tornando-se a religião que hoje conta com o maior número de adeptos. Seus três ramos principais são: o catolicismo, a ortodoxia e o protestantismo (igrejas evangélicas).
I – O que é Rito?
É um conjunto de regras, rituais e cerimônias que se praticam numa Igreja, por ex.: o rito ucraniano. A palavra rito também é utilizada como sinônimo de ritual, cerimônia, por ex.: o rito do batismo, isto é, o ritual, a cerimônia do batismo.
O cânon 28, §1, do CCEO (sigla latina do Código de Cânones das Igrejas Orientais) define rito como “o patrimônio litúrgico, teológico, espiritual e disciplinar, distinto pela cultura e circunstâncias históricas de povos, que se expressa em um modo de viver a fé que é próprio de cada uma das Igrejas autônomas”.
O ser humano é uma criatura inteligente, e como tal tem o dever de reconhecer a verdade, o que inclui o dever de reconhecer, agradecer e venerar a Deus que o criou, o que é feito através da adoração divina. É possível adorar a Deus em casa, na rua ou no trabalho, quer seja ele no escritório, na fábrica ou no campo; em suma – é possível adorar a Deus em qualquer parte.
No entanto, a pessoa humana não foi criada para viver só; ela é um ser social e precisa conviver com os outros, formando famílias, comunidades, organizações, nações, países, e também a Igreja, cuja finalidade é ensinar as verdades divinas e levar o homem a Deus. E como a pessoa humana é obra de Deus-Criador, assim também essas instituições, mesmo que indiretamente, e por isto têm a obrigação de respeitar a Deus e seguir seus preceitos, especialmente a Igreja, que tem esta finalidade específica. Isto é feito através de cerimônias públicas de relacionamento com Deus, ou, em termos corriqueiros, através de cultos públicos de adoração a Deus, em que se inserem também os pedidos e agradecimentos, decorrentes do reconhecimento de que o ser humano depende de Deus, e também a pregação, isto é, o ensino de tudo o que se refere a Deus, especialmente dos Seus preceitos – cuja prática é imprescindível para ser fiel a Ele. Em suma, o culto divino abrange o reconhecimento e a adoração de Deus, os agradecimentos e pedidos, o aprendizado, e a realização de Sua Santa Vontade.
O culto público de Deus é aquele realizado de forma comunitária e dirigido por pessoas especialmente para este fim destinadas (os sacerdotes), e de uma maneira formulada pelo próprio Deus ou pela Igreja. O culto público, pela sua própria natureza, deve ser exterior e se manifestar através de atos, de cerimônias que o público possa não só assistir, como se fosse um espetáculo, mas também participar. E é exatamente este culto público de Deus, – feito dentro de uma estrutura eclesiástica específica e por pessoas específicas, seguindo determinados rituais, realizados de uma maneira e numa língua específica, em lugares preparados especialmente para isto, e seguindo regras específicas, – que compõe um rito. E os ritos, dentro da Igreja Católica, são conservados principalmente na celebração da Santa Missa (que os orientais chamam de Divina Liturgia), na maneira de ministrar os sacramentos e de realizar as demais atividades eclesiais, e na estruturação eclesiástica. Resumindo, rito é a forma exterior de manifestar a fé em Deus e de se relacionar com Ele.
Este é o rito religioso, pois, de maneira geral, rito é toda a forma de ação pública ou em público, consagrada pelo costume e pela tradição. Assim sendo, existe o rito do casamento, o rito de cumprimentar as pessoas, o rito do sepultamento, o rito dos festejos de aniversário, do Ano Novo, etc.
DIFERENÇA ENTRE RITO E FÉ
A palavra fé tem basicamente dois significados: 1) acreditar, por ex.: eu tenho fé em Deus, ele tem fé que vai vencer; 2) doutrina religiosa, por ex.: a fé cristã.
Fé cristã (ou religião cristã, cristianismo) são as verdades de Deus, reveladas por Ele próprio (diretamente ou através de Cristo) e conservadas pela Igreja, que as apresenta aos cristãos para que creiam nelas.
Rito, por sua vez, é a manifestação exterior da fé. Rito é a forma exterior do cristão se relacionar com Deus.
Assim, a fé é única, porque a verdade é única, Deus é único. Já o rito não tem necessidade de ser único, e por isto existem muitos. No rito, isto é, na manifestação exterior da fé – influem os costumes próprios de cada um dos povos cristãos.
A fé cristã é única, pois “há um só Senhor, uma só fé, um só batismo. Há um só Deus e Pai de todos” (Ef 4, 5-6). Há uma só Igreja, Corpo de Cristo: “Creio na Igreja, única, santa, universal e apostólica” (Credo niceno-constantinopolitano). Já os ritos são muitos. Eles são como vestimentas, que com sua variedade de formas e colorações (isto é, de línguas e culturas nacionais) quebram a monotonia e embelezam a Igreja de Cristo. Todas as flores são flores, mas não teria graça nenhuma se todas as flores fossem iguais. Assim também se dá com os cristãos: seria muito monótono se todos os cristãos tivessem que manifestar a sua fé da mesma forma e na mesma língua, e se todas as igrejas fossem iguais. A beleza reside na variedade, na diferença de detalhes, que não alteram a essência. É por isto que existem muitos ritos, classificados basicamente em ocidentais e orientais. E nenhum está ou deveria estar acima dos demais.
Assim sendo, não é correto dizer que todos devem pertencer ao rito latino, porque esse é o “rito certo”, pois é “o rito do Papa”. Acontece que o próprio Cristo celebrou a primeira Missa, a Santa Ceia, num rito oriental, o judaico, acrescentando ao mesmo algumas coisas novas.
Entre os ritos ocidentais predomina o latino; já entre os orientais estão o alexandrino (ou copta), o antioquino (ou sírio), o armênio, o bizantino e o caldeu.
O rito bizantino, que deu origem ao rito ucraniano, provém da cidade de Bizâncio e do Império Bizantino. Bizâncio foi fundada no séc. VII a. C. e passou a chamar-se Constantinopla em 324, quando se tornou capital do Império Romano Oriental, o qual em 395 passou a chamar-se Império Bizantino. O rito bizantino é o mais importante do Oriente, pois de Bizâncio partiram os missionários que cristianizaram, entre outros, a maioria dos povos eslavos. Com o tempo surgiram muitos ritos nacionais, derivados do rito bizantino: albanês, bielo-russo, búlgaro, croata, eslovaco, grego, húngaro, ítalo-albanês, macedônio, melquita, romeno, russo, ruteno (carpático), sérvio e ucraniano. No entanto, pouco diferem entre si, pois à base comum foram agregados tão somente o “espírito nacional”, a língua e os costumes específicos.
Pode parecer estranha a existência de um rito bizantino-italiano, mas é verdadeira. Durante a época do Império Romano, havia muitos gregos na Itália e o rito bizantino era bastante popular. Com o passar dos séculos, a língua latina foi substituindo a grega, e, conseqüentemente, o rito bizantino-italiano também foi sendo substituído pelo latino, apesar de ainda persistir, por exemplo, no mosteiro de São Nilo, em Grottaferrata, perto de Roma, onde se utiliza o grego nas celebrações. Este mosteiro foi fundado no séc. XI. Outro testemunho dessa época é a existência até hoje do Patriarcado de Veneza, atualmente integrado ao rito latino e à Igreja Romana. Observe-se, por exemplo, o estilo bizantino da basílica veneziana de São Marcos. Veneza foi, inclusive, após a tomada de Constantinopla pelos turcos em 1453, um centro de humanismo e cultura grega, graças à presença em seu território de sábios gregos que fugiram dos turcos.
Convém lembrar que Patriarcado é uma instituição característica das Igrejas Orientais. Para maior informação, veja-se, por exemplo, o capítulo “Os Patriarcas Orientais”, parágrafos 7 a 11 do Decreto “Orientalium Ecclesiarum”, do Concílio Vaticano II.
A IGREJA CATÓLICA ROMANA E AS IGREJAS ORIENTAIS
“A Igreja santa e católica, Corpo Místico de Cristo, consta de fiéis que se unem organicamente pela mesma fé, pelos mesmos sacramentos e pelo mesmo regime, no Espírito Santo; coligando-se em vários grupos unidos pela hierarquia, constituem as Igrejas particulares ou os Ritos. Entre elas vigora admirável comunhão, de tal forma que a variedade na Igreja, longe de prejudicar-lhe a unidade, antes a manifesta. A intenção da Igreja católica (isto é, universal; obs. do autor) é que permaneçam salvas e íntegras as tradições de cada Igreja particular ou rito…
“Tais Igrejas particulares, tanto do Oriente como do Ocidente, embora difiram parcialmente entre si pelo que chamam de Ritos, isto é, pela liturgia, pela disciplina eclesiástica e pelo patrimônio espiritual, são, todavia, igualmente confiadas ao governo pastoral do Pontífice Romano, que por determinação divina sucede ao Bem-aventurado Pedro no primado sobre a Igreja universal. Por isso elas gozam de dignidade igual, de modo que nenhuma delas preceda as outras em razão do rito; gozam dos mesmos direitos e se atêm às mesmas obrigações…” (Decreto “Orientalium Ecclesiarum”, Concílio Vaticano II, § 2-3.)
Do acima citado, se deduz que:
1. A Igreja católica (isto é, universal) é uma só em todo o universo, pois professa a mesma fé cristã.
2. A Igreja católica é composta de diversas Igrejas particulares, que são independentes entre si (isto é, cada uma tem administração própria) e diferentes entre si pelo que chamam de rito, mas que, no entanto, são iguais entre si em direitos e obrigações, de modo que nenhuma precede nem pode preceder outra, e todas estão igualmente confiadas ao governo pastoral do Pontífice Romano. Assim, por exemplo, a Igreja Católica Apostólica Romana é apenas uma das Igrejas particulares e está em pé de igualdade com a Igreja Ucraíno-Católica e as demais Igrejas particulares, também chamadas de autônomas ou sui juris.
3. O que diferencia as Igrejas particulares são os ritos. No entanto, rito não é sinônimo de Igreja particular, apesar de muitas vezes ser usado neste sentido. Acontece que as Igrejas particulares católicas orientais são normalmente fruto do chamado uniatismo, isto é, da união com Roma de uma parte de uma Igreja oriental. Assim sendo, o rito ucraniano é praticado tanto pela Igreja Ucraíno-Católica quanto pela Igreja Ortodoxa Ucraniana, apesar de já terem surgido pequenas diferenças no decorrer de quatro séculos de separação (a Igreja Ucraíno-Católica é fruto da União de Berest, de 1596). Isto quer dizer que o rito, o “sistema” das duas Igrejas é praticamente o mesmo, apesar de estarem estruturalmente separadas. Em outras palavras, podemos dizer que muitos povos orientais (isto é, da área de influência do antigo Império Romano Oriental) têm o seu próprio rito, que normalmente é comum a duas Igrejas – uma católica e outra separada.
É por isto que o Decreto “Orientalium Ecclesiarum”, do Concílio Vaticano II, afirma em seu parágrafo 24:
“Às Igrejas Orientais que vivem em comunhão com a Sé Apostólica de Roma compete a peculiar obrigação de favorecer… a unidade de todos os cristãos, principalmente os orientais (ortodoxos, etc.; obs. do autor), pela oração e pelo exemplo de vida, pela fidelidade religiosa para com as antigas tradições orientais, por um melhor conhecimento mútuo, pela colaboração e estima fraterna das coisas e das almas.” (Conf. Cânon 903 do CCEO.) Isto quer dizer que, no caso específico de nós, ucranianos, tanto católicos quanto ortodoxos, devemos rezar juntos, devemos conviver, nos conhecer e colaborar mutuamente, buscando a estima fraterna. Ou, como disse o Papa João Paulo II na visita à Catedral Ucraíno-Católica de Buenos Aires no dia 10 de abril de 1987, devemos nos aproximar dos nossos irmãos ortodoxos e juntos buscarmos a verdadeira união em Cristo!
Resumindo, a Igreja Católica é uma federação de 24 Ritos ou Igrejas particulares (autônomas, sui juris), em completa comunhão entre si e com o Papa, como Sumo Pontífice da Igreja Universal (também chamado Pontífice Romano). O Papa, na sua qualidade de Patriarca de Roma, também é o chefe da maior das Igrejas sui juris, a Igreja Latina (também conhecida como Igreja Católica Apostólica Romana). As restantes 23 Igrejas sui juris, conhecidas coletivamente como “Igrejas Católicas Orientais”, são governadas por um hierarca-mor (Patriarca, Arcebispo-Mor, Metropolita, Exarca, ou Administrador Apostólico). A Cúria Romana administra tanto as Igrejas orientais, quanto a Igreja ocidental. Devido a este sistema, é possível que um católico esteja em comunhão plena com o Pontífice Romano, sem ser um católico “romano”.
As Igrejas sui juris utilizam uma das seis correntes litúrgicas tradicionais (que emanam de sés históricas), chamadas Ritos. Os ritos principais são: Romano, Bizantino, Antioquino, Alexandrino, Caldeu e Armênio. O Rito Romano, usado pela Igreja Latina, é dominante na maior parte do mundo, e é usado pela vasta maioria dos católicos (mais de 90%). Antigamente havia muitos ritos ocidentais menores, que foram substituídos pelo Rito Romano nas reformas litúrgicas do Concílio de Trento. No entanto, alguns desses ritos ocidentais menores ainda persistem.
Historicamente, o Santo Sacrifício da Missa, no Rito Romano, a chamada “Missa Tridentina” – era celebrada inteiramente em latim eclesiástico, mas no Concílio Vaticano II, no início dos anos 60 do século passado, foi promulgada uma nova versão da Missa (Novus Ordo Missae), que é celebrada na língua vernácula, isto é, local. A celebração correspondente das Igrejas Católicas Orientais, a Divina Liturgia, também passou a ser feita na língua vernácula de cada uma das Igrejas, apesar de às vezes ser mantido um pouco da língua em que cada povo foi evangelizado, por exemplo, no rito ucraniano ainda se mantém um pouco de grego e de eslavônico (a antiga língua eslava).
Observe-se que dentro da Igreja Romana existem quatro ritos, mas que não se constituem em Igrejas à parte. São eles:
Rito Latino Romano – o predominante.
Rito Ambrosiano – utilizado na Arquidiocese de Milão; teve sua origem em Santo Ambrósio , mentor de Santo Agostinho.
Rito Moçárabe – oriundo dos árabes convertidos ao cristianismo na Espanha, durante a reconquista. Durante muito tempo foi usado apenas numa capela da catedral de Toledo, a diocese primaz da Espanha, e mais nove paróquias. Desde 1993 pode ser usado em todo o território do país.
Rito Galicano ou Lionês – utilizado na Arquidiocese de Lyon, primaz da França.
Ultimamente tem se estabelecido um uso anglicano, que não é propriamente um rito, para acomodar os anglicanos que adotaram o catolicismo. Trata-se de uma forma adaptada do rito anglicano.
Funcionalmente, as Igrejas Orientais Católicas dependem da Congregação para as Igrejas Orientais, criada em 1862 como seção da Congregação de “Propaganda Fidei” (Propagação da Fé), e elevada em 1917 à categoria de Sagrada Congregação.
Em direito canônico fala-se de Igrejas rituais ou autônomas, em latim – sui juris, para referir-se às Igrejas particulares, em comunhão com o Pontífice Romano, que têm uma organização, disciplina e direito próprios, e que respondem a tradições espirituais e litúrgicas próprias. O Código de Cânones das Igrejas Orientas (em latim: Codex Canonum Ecclesiarum Orientalium – CCEO) define as Igrejas Orientais como “a agrupação de fiéis cristãos unidos à hierarquia, que a autoridade suprema da Igreja reconhece expressa ou tacitamente como sui juris” (cânon 27).
II – As Igrejas Orientais Católicas
De acordo com o Código de Cânones das Igrejas Orientais, estas Igrejas sui juris ou autônomas se dividem em quatro categorias: Igrejas Patriarcais (Igreja Armênia, Caldéia, Copta, Maronita, Melquita e Siríaca); Igrejas Arquiepiscopais Maiores (Igreja Ucraniana, Siríaco-Malabar, Siríaco-Malancar e Romena); Igrejas Metropolitanas sui juris (p. ex.: a Igreja Etíope, a Igreja Rutena na América, e a Igreja Eslovaca); e as demais Igrejas sui juris, dentre as quais algumas ainda não possuem hierarquia episcopal própria.
Por outro lado, devido às grandes migrações populacionais dos últimos tempos, a Santa Sé erigiu em alguns países ocidentais os Ordinariatos para os fiéis das Igrejas Orientais que residem em países onde não existe uma hierarquia católica do próprio rito. Os católicos de rito oriental que residem em países em que não existe nem hierarquia própria nem ordinariato específico – dependem do ordinário latino local (p. ex.: os ucraíno-católicos do Paraguai). As Igrejas Católicas Orientais autônomas, em comunhão com o Pontífice Romano, agrupadas segundo a tradição a que pertencem, são as que seguem (de acordo com o site www.iuscanonicum.org e outras fontes). Convém ressaltar que, por ocasião da promulgação do CCEO em 18 de outubro de 1990, elas eram 21; agora são 23, pois a antiga Igreja “Iugoslava” foi subdividida em Croata, Macedônia e Sérvia. Em algumas listagens constam 24, incluindo a Igreja Católica Bizantina Georgiana.
RITO ALEXANDRINO (COPTA)
Igreja Católica Copta (Patriarcado com sede em Alexandria e diversas eparquias no Egito). – Coptas eram antigos habitantes do Egito que, aceitando o cristianismo, caíram na heresia monofisista de Eutíquio (morto em 454). Eles reconhecem em Cristo apenas a natureza divina (nós reconhecemos duas naturezas em uma só pessoa: a divina e a humana). No século XVII uma pequena parte dos coptas uniu-se a Roma, e seu patriarcado foi instituído em 1899. Em sua liturgia, eles utilizam basicamente três línguas: copta, grego e árabe.
Igreja Católica Etíope (Metropolita com sede em Addis Abeba , na Etiópia, e diversas eparquias na Etiópia e na Eritréia). – Os etíopes ou abissínios constituem um dos mais antigos povos cristãos. Eles têm muitos rituais próprios e são grandes devotos da Santíssima Mãe de Deus. A maioria absoluta é copta monofisista. Já os católicos etíopes, que até 1961 pertenciam à Igreja Católica Copta (do Egito), agora são autônomos.
RITO ANTIOQUINO (SÍRIO)
Igreja Católica Siríaca Malancar (Arquiepiscopado Maior criado em 2005, com sede em Trivandrum, na Índia, país onde tem diversas eparquias). – Vivendo na costa do Malabar, Índia, a maioria dos malancares é monofisista, no entanto, os católicos malancares somam algumas centenas de milhares, e por isto sua Igreja foi elevada a Arquiepiscopado Maior.
Igreja Maronita (“Patriarcado Antioquino dos Maronitas”, com sede no Líbano). – A palavra maronita provém de Maron, um monge que viveu no século V e é considerado o fundador desta Igreja. No século IX os maronitas emigraram para o Líbano. Uniram-se a Roma na época das Cruzadas, em 1215, união esta oficializada pelo papa Inocêncio III através da bula “Quia divinae sapientia”, de 4 de janeiro de 1216. Até o século XVIII os maronitas utilizavam a língua síria; hoje usam o árabe e o francês. No entanto, a língua síria ainda persiste na liturgia. Aqui no Brasil, os maronitas têm uma Eparquia, sediada em São Paulo (Catedral Nossa Senhora do Líbano, inaugurada em 1971 – Rua Tamandaré, 335, Liberdade; bispo atual – Dom Edgard Madi, que assumiu em 10 de dezembro de 2006), além de paróquias em Campinas, Rio de Janeiro e Porto Alegre. Ao todo, há mais de um milhão e meio de maronitas, dos quais pelo menos um terço vive fora do Oriente Médio. A Igreja Maronita tem arquieparquias e eparquias no Líbano, Chipre, Egito, Síria, Israel, Argentina, Brasil, Estados Unidos, Austrália, Canadá e México, além de exarcados na Jordânia e na Palestina.
Igreja Católica Síria ou Siríaca (“Patiarcado Antioquino dos Sírios”). – Jacob Baradeu foi um monge sírio monofisista, que faleceu em Edessa por volta do ano 578. Sagrado bispo em 543, ele revitalizou as comunidades monofisistas da Armênia e da Mesopotâmia. Posteriormente, ele criou na Síria uma hierarquia monofisista autônoma, que originou a Igreja Jacobita. Uma parte dessa Igreja religou-se a Roma no séc. XVIII, dando origem à Igreja Católica Síria, que aqui no Brasil tem uma paróquia em Belo Horizonte (Igreja do Sagrado Coração de Jesus – Av. Carandaí, 1010, bairro Funcionários – 30130-060 Belo Horizonte, MG). Esta paróquia está vinculada ao Ordinariato para os Fiéis de Rito Oriental – Arcebispado do Rio de Janeiro. Os católicos siríacos vivem principalmente na Síria, Líbano, Iraque, Palestina e Egito. Em alguns locais ainda conservam a antiga língua aramaica, que era utilizada por Cristo. A maioria dos siríacos, no entanto, continua sendo monofisista, e pertence à Igreja Jacobita, atualmente mais conhecida como Igreja Siríaca ou Siriana Ortodoxa (representada no Brasil pela ICOSB – Igreja Católica Ortodoxa Siriana do Brasil, que faz parte do CONIC – Conselho Nacional de Igrejas Cristãs). Os siríacos utilizam a Liturgia de Jerusalém, formulada pelo apóstolo São Tiago. A Igreja Católica Siríaca tem arquieparquias e eparquias no Líbano, Egito, Sudão, Síria, e Estados Unidos e Canadá (a eparquia de Newark, Estados Unidos, tem jurisdição sobre os fiéis desse rito em ambos os países), além de exarcados na Jordânia, Kuwait, Palestina, Turquia e Venezuela.
RITO ARMÊNIO
Igreja Católica Armênia (Patriarcado sediado na Cilícia). – A Igreja Armênia é uma das mais antigas, pois a Armênia foi cristianizada ainda no séc. II. No entanto, foi só no séc. IV que o cristianismo tornou-se popular, graças à ação de Gregório I, o Iluminador. No séc. VI os armênios adotaram o monofisismo. Os armênios monofisistas (separados) também são conhecidos como gregorianos. Séculos mais tarde, uma parte deles uniu-se a Roma. Na cidade de São Paulo há uma grande colônia armênia, parte da qual é católica (Igreja São Gregório, o Iluminador: Av. Tiradentes, 718, Bairro da Luz – 01102-000 São Paulo, SP). Eles pertencem à Eparquia São Gregório de Narek, sediada em Buenos Aires – Argentina; bispo atual – Dom Vartan Waldir Boghossian, SDB. A Igreja Católica Armênia também tem arquieparquias e eparquias no Líbano, Irã, Iraque, Egito, Síria, Turquia, Ucrânia e França, além de um exarcado patriarcal para Amã (Jordânia) e Jerusalém, e de um exarcado para os Estados Unidos e o Canadá, sediado em Nova York , além de Ordinariatos para os fiéis de rito armênio na Grécia (com sede em Atenas), na Romênia (com sede em Gherla) e para a Europa Ocidental (com sede em Ghiumri).
RITO BIZANTINO
Igreja Católica Bizantina Albanesa (Administração Apostólica na Albânia). – Durante a vigência do regime comunista na Albânia, esta Igreja atuava principalmente entre os refugiados albaneses na Itália. Após a re-democratização da Albânia, a Igreja Albanesa está se reorganizando naquele país.
Igreja Católica Bizantina Bielo-Russa. – Esta Igreja atua basicamente na Bielo-Rússia (Bielarus), onde também se pratica o rito latino. No entanto, a maioria absoluta dos bielo-russos é ortodoxa.
Igreja Católica Búlgara (Exarcado Apostólico em Sófia). – É uma das mais antigas Igrejas eslavas. Atualmente os búlgaro-católicos são muito reduzidos. A maioria dos búlgaros é ortodoxa e tem o seu próprio patriarcado, com sede em Sófia.
Igreja Católica Bizantina Croata (uma das partes da antiga Igreja “Iugoslava”). – Os católicos de rito oriental estão reunidos numa eparquia, com sede em Krizevci, que, além da Croácia, também tem jurisdição sobre a Bósnia-Herzegovina e a Eslovênia. A maioria dos croatas, no entanto, é católica romana.
Igreja Greco-Católica da Eslováquia. – Em 30.01.2008, o Papa Bento XVI elevou a Igreja Eslovaca à categoria de metropólia (arquieparquia), com sede em Prasziv, cujo bispo, Jan Babiak, foi elevado a Arcebispo-Metropolita. O exarcado de Kozyczi foi elevado a eparquia, e também foi criada a eparquia de Bratislava, ambas vinculadas à metropólia. Os membros da Igreja Eslovaca são basicamente eslovacos, ucranianos e rutenos, atendidos por PP. Basilianos e Redentoristas bizantinos, e por Irmãs Basilianas e Servas de Maria Imaculada – SMI (http://www.ugcc.org.ua).
Igreja Católica Bizantina Grega. – Antigamente, a Igreja Grega englobava todo o Império Romano Oriental (ou Bizantino), inclusive parte da Itália. Hoje, os gregos católicos não passam de alguns milhares, agrupados em dois exarcados: Grécia e Turquia. A maioria dos gregos é ortodoxa, e, além da Grécia, eles habitam também no Chipre e na Turquia, onde está sediado o Patriarcado de Constantinopla, que exerce o primado entre os ortodoxos. A Igreja Ortodoxa da Grécia é autocefálica e chefiada por um arcebispo-mor.
Igreja Católica Bizantina Húngara. – Tem uma eparquia e um exarcado apostólico na Hungria.
Igreja Católica Ítalo-Albanesa. – Tem eparquias na Itália. Segundo o Ordinariato para os fiéis de Ritos Orientais – Arcebispado do Rio de Janeiro, quem responde pelo rito bizantino de língua ítalo-albanesa no Brasil é o Pe. Atanásio Leonardo Acursi, OSBI – Rua Marechal Rondon, 1752, apto. 504, Riachuelo – 20950-001 Rio de Janeiro, RJ – Telefone: (21) 261-9716.
Igreja Católica Greco-Melquita (“Patriarcado de Antioquia dos Greco-Melquitas”, com sede em Damasco, na Síria). – Os melquitas estão unidos a Roma desde 1724 e somam algumas centenas de milhares. Têm arquieparquias e eparquias na Síria, Líbano, Jordânia, Israel, Brasil, Estados Unidos, Canadá, México e Austrália, além de exarcados patriarcais em Jerusalém, Egito e Sudão, Iraque, Kuwait, e Venezuela. A eparquia brasileira dos melquitas, cujo bispo atual é Dom Fares Maakaroun, está sediada em São Paulo (Catedral Nossa Senhora do Paraíso – Rua do Paraíso, São Paulo, SP – Celebram em árabe e usam bastante o grego. Os melquitas ortodoxos (Igreja Católica Apostólica Ortodoxa Antioquina) são mais numerosos que os católicos. A Igreja São Jorge, situada à Rua Brigadeiro Franco, em frente à Sociedade dos Amigos da Cultura Ucraniana, em Curitiba, pertence a eles. A denominação melquita provém da palavra árabe “melek”, que significa real, da realeza.
Igreja Macedônia (outra parte da antiga Igreja “Iugoslava”). – Com sede em Strumica, tem jurisdição sobre a Macedônia.
Igreja Católica Bizantina Romena (Arquiepiscopado Maior, instituído pelo Papa Bento XVI em 16 de dezembro de 2005). – Após a separação de 1054, a Igreja da Romênia permaneceu do lado ortodoxo. Atualmente, a maioria dos romenos é ortodoxa e tem o seu próprio patriarcado, com sede em Bucarest. No entanto, mesmo depois de 1054, os romenos continuaram mantendo contatos com Roma. Em 1698 foi realizado um sínodo na cidade de Alba Julia, e o bispo Atanásio aceitou a união com a Igreja de Roma. Em 1700 outro sínodo confirmou esta união. Assim sendo, 1700 é considerado o ano em que surgiu oficialmente a Igreja Romeno-Católica. Atanásio foi seu primeiro bispo. Atualmente, a Igreja Romeno-Católica, que tem quatro eparquias na Romênia e uma nos Estados Unidos, é liderada por Dom Lucian Muresan, Arcebispo-Mor de Fagaras e Alba Julia. Fiéis: cerca de 750.000.
Igreja Católica Bizantina Russa. – A maioria dos russos é ortodoxa. No entanto, existe uma pequena minoria unida com Roma. Desde 20.12.2004, o bispo latino José Verta é também ordinário para os católicos de rito bizantino na Rússia, onde no início de 2007 trabalhavam 18 sacerdotes greco-católicos (UGCC News – 11.02.2007). Em Roma existe o instituto “Russicum”. No Brasil, os católicos russo-bizantinos, dependentes do Ordinariato para os fiéis de Ritos Orientais – Arcebispado do Rio de Janeiro, estão organizados em torno do Instituto São Vladimir – Rua Bom Pastor, 460 – 04203-000 São Paulo, SP.
Igreja Católica Bizantina Sérvia. – É uma das partes da antiga Igreja “Iugoslava”, junto com as Igrejas Croata e Macedônia.
Igreja Greco-Católica Ucraniana (Arquiepiscopado Maior instituído em 1963; sede atual – Kyiv, ou Kiev, segundo a grafia russa popularizada mundo afora). – Neste ano a Igreja Ucraniana completa 1020 anos. Hoje ela constitui-se da Igreja Ucraíno-Católica, com cerca de sete milhões de fiéis (a mais numerosa das Igrejas Orientais Católicas), e da Igreja Ortodoxa Ucraniana, com cerca de quarenta milhões de fiéis. Infelizmente, os ortodoxos ucranianos estão divididos em várias facções, sendo que as principais são: Igreja Ortodoxa Ucraniana – Patriarcado de Kyiv, com o maior número de fiéis da Ucrânia; Igreja Ortodoxa Ucraniana (vinculada ao Patriarcado de Moscou), que domina a maior parte das igrejas e mosteiros da Ucrânia; Igreja Ortodoxa Autocefálica Ucraniana (da Ucrânia); e Igreja Ortodoxa Ucraniana da Diáspora, vinculada ao Patriarcado de Constantinopla, da qual faz parte a Igreja Ortodoxa Autocefálica Ucraniana do Brasil, Argentina e Paraguai –uma eparquia sediada em Curitiba.
Depois da re-democratização da Ucrânia, a sede da Igreja Ucraíno-Católica, ainda na época de Dom Myroslav Ivan Liubachivskyi, foi transferida de Roma para Lviv, na Ucrânia Ocidental, onde predominam os católicos; e desde agosto de 2005 sua sede está em Kyiv, capital da Ucrânia, onde predominam os ortodoxos, e atualmente é liderada pelo Arcebispo-Mor e Cardeal Lubomyr Husar. Um de seus bispos auxiliares é Dom Dionísio Lachovicz, aqui do Brasil. Igrejas ortodoxas (principalmente o Patriarcado de Moscou) protestaram contra esta mudança para Kyiv, afirmando que a mesma seria uma forma de proselitismo e desrespeito a elas, o que foi negado pelo cardeal Husar, dizendo que a mudança decorria simplesmente do desenvolvimento de sua Igreja, e que a mesma devia estar sediada no seu berço de origem – a cidade de Kyiv. O Vaticano “reconheceu” essa mudança em 29.12.2005, quando um comunicado do Vatican Information Service (VIS) se referiu ao Cardeal Husar como “Arcebispo-Mor de Kyiv e Halych”, seu novo título, e não mais como “Arcebispo-Mor de Lviv”. Às margens do legendário Rio Dnipró (Dnieper, em russo), está sendo construída a Catedral (Sobor) Patriarcal da Ressurreição e o Palácio Patriarcal – sede administrativa.
Além da Ucrânia, os ucraíno-católicos têm três metropólias (ou metrópolis, isto é, arquieparquias) no exterior: Polônia, Estados Unidos e Canadá (com diversas eparquias vinculadas), além de eparquias no Brasil (Curitiba), Argentina (Buenos Aires) e Austrália (para Austrália, Nova Zelândia e toda a Oceania), e exarcados apostólicos na Alemanha (Munique), Inglaterra (Londres) e França (para França, Benelux e Suíça, com sede em Paris). A eparquia brasileira, dedicada a São João Batista, conta atualmente com quatro bispos: Dom Volodemer Koubetch – Eparca (sediado em Curitiba), Dom Meron Mazur – Bispo Auxiliar (em Pitanga), Dom Daniel Kozlinski – Bispo Auxiliar (em União da Vitória), e Dom Efraim Basílio Krevey – Bispo Emérito (Curitiba).
Já os ortodoxos ucranianos no Brasil não chegam a 10% da população de origem ucraniana, e são liderados pelo bispo Jeremias Ferens, residente em Curitiba.
Igreja Católica Bizantina Rutena, também conhecida como Igreja Ruteno-Ucraniana ou Igreja Carpática Rutena (Карпато-Руська Церква; metropólia com sede nos Estados Unidos). – “Separatistas” ucranianos provenientes da região dos Montes Cárpatos (província da Zakarpáttia), que durante séculos estiveram som o domínio húngaro, e por isto têm uma maneira diferente de ser e de pensar, constituíram nos Estados Unidos a Igreja Carpática Rutena, sediada em Pittsburgh, na Pensilvânia. Além da referida metropólia (arquieparquia), eles têm eparquias em Parma – Ohio, Passaic – New Jersey, e Van Nuys. Além dos católicos, a Igreja Rutena conta também com uma metropólia ortodoxa, sediada em Johnstown.
Depois da re-democratização da Ucrânia, a Eparquia Greco-Católica da Zakarpáttia seguiu o mesmo rumo.
Também tem um exarcado apostólico na República Tcheca (com sede em Praga).
RITO CALDEU
Igreja Caldéia ou Caldeana (“Patriarcado da Babilônia dos Caldeus”, com sede em Bagdá). – Na metade do século XV essa Igreja uniu-se a Roma. Há cerca de 500.000 caldeus católicos, cujo patriarca atual (desde 04/12/2003) é Karim III Delly. Um caldeu católico muito conhecido foi Tarik Aziz, ministro das relações exteriores de Sadam Hussein. Esta Igreja tem arquieparquias e eparquias no Iraque, Irã, Líbano, Egito, Síria, Turquia, Estados Unidos e Oceania (Austrália e Nova Zelândia, com sede em Sidney), e um exarcado patriarcal em Jerusalém. Os caldeus separados, em menor número, são nestorianos.
Igreja Católica Siríaco-Malabar (Arquiepiscopado Maior criado em 1992; sede: Ernakulam-Angamaly, Índia). – Esta é uma das mais antigas Igrejas do sudeste da Ásia, e uma das mais atuantes do Oriente, com mais de um milhão de fiéis. Tem arquieparquias e eparquias na Índia e nos Estados Unidos. Gostam de ser chamados de cristãos de São Tomé, que pregou a fé cristã nessa região da Índia (Malabar). Os malabares separados são nestorianos e não passam de alguns milhares.
ORDINARIATOS
Além das estruturas anteriormente descritas, em alguns países existem Ordinariatos para os fiéis de rito oriental que não têm ordinário do próprio rito. São os seguintes: Buenos Aires – Argentina; Rio de Janeiro – Brasil (Arcebispado do Rio de Janeiro); Paris – França; Varsóvia – Polônia; e Viena – Áustria.
III – O Rito Ucraniano
O QUE É RITO UCRANIANO?
O rito ucraniano é um ramo do rito bizantino, seguido pelos ucranianos da Igreja Ucraíno-Católica e da Igreja Ortodoxa Ucraniana. O povo ucraniano recebeu a fé cristã através de Bizâncio (que em 324 passou a se chamar Constantinopla, atual Istambul, na Turquia), e por isto adotou o rito bizantino. Em 988, São Valdomiro, o Grande, oficializou o Cristianismo na Ucrânia, promovendo o batismo em massa do povo ucraniano no rito bizantino, em que ele mesmo já havia sido batizado, bem como sua avó, Santa Olga, que governou a Ucrânia de 945 a 964. Esse rito já havia sido difundido em terras ucranianas, principalmente a partir da época dos apóstolos dos eslavos, os santos irmãos Cirilo e Metódio. Supõe-se que foram eles que, ao pregar em terras búlgaras, no final do século IX, criaram o alfabeto eslavo, conhecido até hoje como cirílico. No entanto, sua autoria também é atribuída a seu discípulo Clemente da Bulgária, falecido no ano 916. Cirilo e Metódio introduziram a língua eslava no rito bizantino.
Na Ucrânia, o rito bizantino, com o passar dos séculos, foi sendo ucrainizado. Já no início da Igreja na Ucrânia, a língua grega do rito bizantino foi substituída pela antiga língua eslava – o páleo-eslavo (старослов’янська мова), também conhecida como “eslavônico”, que então era comum a todos os eslavos.
Hoje em dia, por decisão do Sínodo dos Bispos Ucranianos e com a aprovação da Sé Apostólica, as celebrações da Igreja Ucraíno-Católica são feitas basicamente em ucraniano. Por força das circunstâncias, também é utilizada a língua local de onde vivem os ucranianos: português no Brasil, espanhol na Argentina e no Paraguai, inglês nos Estados Unidos, Canadá, Inglaterra, Austrália e Nova Zelândia, e assim por diante.
No decorrer de mil anos de Cristianismo na Ucrânia, também passaram a fazer parte do rito bizantino muitos costumes ucranianos, tais como: festas, canções e orações, maneira de construir, pintar e ornamentar igrejas, artesanato em geral, e muitas outras peculiaridades, próprias dos ucranianos. Com todas estas características ucranianas, o rito bizantino, no seio do povo ucraniano, passou a ser na verdade – rito ucraniano.
O rito ucraniano tem tudo o que é necessário para a vivência cristã e a santificação de seus membros, e por isto não é preciso copiar nada dos outros, bastando-lhes vivenciar, aproveitar e desenvolver o seu próprio rito ucraniano.
ALGUMAS CARACTERÍSTICAS DO RITO UCRANIANO
A língua e a cultura ucraniana. – O primeiro e principal componente do rito ucraniano, é óbvio, são os próprios ucranianos, e o que mais os caracteriza – é a sua língua e cultura. Portanto, um dos fatores que caracterizam um rito – é a sua língua. É a língua latina do Império Romano Ocidental que classificou o respectivo rito como latino-romano, sendo até hoje a língua oficial do Vaticano e da Igreja Romana. É a língua grega do Império Romano Oriental que classificou o respectivo rito como grego-bizantino. E é a língua ucraniana, além do país, que classifica o rito ucraniano como tal.
Há vários séculos muitos ucranianos se estabeleceram na Romênia e na Hungria, e quando passaram a utilizar a língua romena ou húngara em suas celebrações litúrgicas – então foram perdendo sua identidade e tornando-se tão romenos ou húngaros como os autóctones, e se desligaram do rito ucraniano, pois perderam o vínculo. O rito que eles praticam é simplesmente bizantino-romeno ou bizantino-húngaro. Assim sendo, o que classifica e denomina um rito – é a sua origem (bizantino, antioquino, caldeu, etc.) ou a língua utilizada (latim, ucraniano, etc.) É por isto que o Papa João Paulo II, quando esteve em Curitiba, se dirigiu aos ucraíno-católicos em ucraniano e pediu aos mesmos que mantivessem a sua identidade ucraniana, pois língua e identidade são inseparáveis. Também vale lembrar as palavras do falecido Metropolita Ucraíno-Católico do Canadá, Maksym Hermaniuk: “Não existe Igreja Ucraniana sem a Cultura Ucraniana. Não existe Cultura Ucraniana sem a Língua Ucraniana.” (Revista “Ekran”, nº 138, Chicago, USA, pág. 3.)
Um grande exemplo de como é possível manter a sua própria identidade em terras estrangeiras – é o povo judeu. Por todo o mundo eles são judeus e mantêm a sua religião. Nas sinagogas e residências – rezam e lêem a Sagrada Escritura em hebraico. Por toda a parte eles têm suas escolas, em que ensinam a língua, a cultura e a religião hebraica a suas crianças. Além disto, são sepultados em cemitérios próprios, com epitáfios escritos em hebraico. Tudo isto os ajuda a serem judeus conscientes, conservando a sua própria identidade, e assim não são apenas um bando de gente, mas constituem um verdadeiro povo, com características próprias, que se identifica e colabora entre si. Por isto, por manterem rigidamente a sua identidade nacional e religiosa, além de serem muito numerosos então na Ucrânia – é que entre 1918 e 1921, quando a Ucrânia foi independente, lá existia o Ministério de Assuntos Judaicos.
A arquitetura e ornamentação das igrejas. – Também faz parte do rito o estilo das igrejas, tanto na arquitetura quanto na ornamentação interna e na paramentação dos celebrantes. É verdade que a arquitetura das igrejas ucranianas tem sua origem na arquitetura bizantina, mas também ela já se ucrainizou. As cúpulas ucranianas, por exemplo, têm característica própria, sendo diferentes tanto da original bizantina, quanto da variante russa. Também as igrejas ucranianas de madeira dos hutsule, boikos, lemkos e de toda região carpática – têm sua arquitetura própria, toda especial (vejam a réplica da igreja de Serra do Tigre, localizada no Memorial Ucraniano – Parque Tingüi, em Curitiba). Mesmo aqui no Brasil, especialmente no Paraná, onde se concentram os ucranianos, quem conhece a cúpula ucraniana – imediatamente identifica uma igreja se é ucraniana ou latina.
Tradicionalmente, as igrejas ucranianas eram em forma de cruz. Atualmente, por praticidade e redução de custos – é bastante utilizada a forma retangular.
Outra característica das igrejas ucranianas e bizantinas em geral é o “ikonostás” (ou iconostássio, de forma abrasileirada; também se usa “iconóstase”, do grego), que é aquela parede de ícones que separa o santuário da nave. Isto acontece a exemplo do tabernáculo, o templo judaico do Antigo Testamento, cuja planta foi ditada a Moisés pelo próprio Deus: “Cuida de fazê-los conforme o modelo que te foi mostrado na montanha” (Êx 25, 40). O “Santo” e o “Santo dos Santos” eram separados por cortinas. No “Santo” entravam apenas os sacerdotes. Já no “Santo dos Santos” entrava apenas o sumo-sacerdote uma vez por ano.
O “ikonostás”, essa parede de “santos”, lembra aos fiéis que além dela se realiza um santo mistério – a renovação do sacrifício de Cristo pela redenção da humanidade, o mistério da transformação do pão e vinho em Corpo e Sangue de Cristo, que, sendo mistério, não pode ser visto, e assim o ato da consagração não precisa ser visto, basta crer nele. É por isto que na hora da consagração há aquele ar de mistério e veneração. Tradicionalmente, pelas portas centrais do “ikonostás”, as portas reais, só passam os bispos e sacerdotes. Do lado direito das portas reais deve haver um ícone de Jesus Salvador, e do lado esquerdo – um ícone da Mãe de Deus. E além do “ikonostás”, isto é, no santuário, só circulam celebrantes e servidores.
Tudo isto é regulamentado pelas “Diretrizes para as Celebrações Litúrgicas”, documento da Sagrada Congregação para as Igrejas Orientais, que também determina que o altar principal deve ficar no centro do santuário. Na parte detrás do santuário, junto à parede, do lado esquerdo, deve ficar a mesa das oferendas (proskomedienek); e do lado direito, se necessário, uma mesa com as vestes sacerdotais preparadas para o uso. No centro do altar deve estar o tabernáculo (kevót), em forma de uma pequena igreja, no qual se conserva o Santíssimo Sacramento da Eucaristia. Atrás do altar, no centro da parede, deve ficar um grande ícone do santo patrono da igreja, e não um crucifixo. Deve haver um crucifixo no altar e outro no cume do “ikonostás”. No centro da parte frontal da nave, isto é, da parte destinada aos fiéis, deve ficar uma mesa ou pequeno altar, chamado “tetrapód”, no qual deve haver um crucifixo maior, de pé, ladeado por dois castiçais com velas, e deitado sobre a mesa deve haver outro crucifixo, pequeno, além de um quadro do santo patrono da igreja, para serem osculados, beijados pelos fiéis.
A Missa e demais celebrações litúrgicas. – A Missa no rito ucraniano, ou Divina Liturgia, é essencialmente a mesma que no rito latino ou nos demais ritos católicos, mas a sua forma é diferente. A liturgia ucraniana tem origem na Liturgia de Jerusalém, formulada pelo apóstolo São Tiago. Ela foi reformada por São Basílio Magno e abreviada por São João Crisóstomo, no século IV, e é celebrada em ucraniano. Além dos ucraíno-católicos, a Liturgia de São João Crisóstomo é também utilizada pelos ortodoxos ucranianos e por grande parte dos cristãos do Oriente. Tradicionalmente, a missa ucraniana é cantada. Só mais recentemente é que foi introduzida a missa “rezada”, isto é, recitada, que ainda não é praticada pelos ortodoxos. Outra característica é que na Igreja Ucraniana não se utiliza nenhum instrumento musical. O ucraniano manifesta a sua fé em público essencialmente através do canto e de um rico cerimonial.
Além da missa, quase todas as demais celebrações litúrgicas ucranianas são cantadas. Entre essas celebrações, podemos citar: – o “molébenh”, culto de veneração e pedido de graças, sendo que os mais populares são dedicados ao Sagrado Coração de Jesus, a Nossa Senhora e a São José; – a “panakhêda”, culto pela alma de uma ou de várias pessoas falecidas; e as celebrações do Ofício Divino: – a “útrenia” (matinas), culto de adoração matinal a Deus; – a “vetchírnia” (vésperas), culto de adoração vespertina a Deus; – a “povetchíria” (culto da noite), a “pivnitchna” (culto da meia-noite) e os “tchassê” (horas), que são quatro cultos diurnos, dividindo o dia em quatro “tempos”. Isto além dos cultos de celebração dos demais sacramentos, também chamados de ritos: rito do batismo, etc. Estes cultos abrangem todas as verdades e mistérios da fé cristã; eles foram compostos no decorrer dos séculos por santos e Padres da Igreja. Além destes cultos, há no rito ucraniano muitas canções religiosas independentes, isto é – que não fazem parte fixa dos cultos: entre elas destacam-se as “koliadê” – canções da época natalina, que vai do Natal ao dia 1 de fevereiro, véspera da festa da apresentação e consagração de Cristo no templo – “Strítennia” (Lc 2, 22-23). Também temos as “voskrésni pisni” – canções da Ressurreição, que são cantadas desde o dia da Páscoa até a véspera do dia da Ascensão de Cristo; as “strásni pisni” – canções da grande quaresma; além de canções a Deus Pai-Criador, a Jesus Cristo, ao Espírito Santo, à Mãe de Deus e aos Santos.
A Comunhão sob duas espécies. – Própria do rito ucraniano (e dos bizantinos em geral) também é a Comunhão sob as duas espécies – pão e vinho. Os bizantinos não negam a presença de Cristo na Comunhão sob uma só espécie, no entanto, Cristo disse claramente: “Tomai e comei, isto é o meu corpo…” e “Bebei dele todos, pois isto é o meu sangue…” (Mt 26, 26-28.)
POR QUE OS UCRANIANOS DEVEM MANTER O RITO UCRANIANO?
Por causa da lei natural. – Todas as comunidades étnicas, em todo o mundo, têm, a exemplo do povo judeu, anteriormente citado, a preocupação de transmitir a seus filhos a sua própria língua e cultura, além do sentimento de se sentirem membros da sua própria comunidade e do seu próprio povo. Não existe povo na face da terra que deseja que a sua diáspora se desnacionalize, assimilando-se totalmente e o mais rápido possível ao povo do local de imigração. Pelo contrário, os corpos diplomáticos, constituídos de embaixadores, cônsules, adidos culturais, etc., sempre tiveram entre suas incumbências a de ajudar os seus emigrantes a manter a sua própria identidade. Este fato é geral e permanente, acontece sempre e com todos os povos, em maior ou menor grau, pois decorre da lei natural que manda a pessoa humana amar e respeitar aquilo que é seu, inclusive o país e o povo de seus antepassados. E isto é uma virtude, chamada patriotismo. Virtude, porque manda dar aos pais, ao seu povo e seu país – o tributo de gratidão pelo bem, pela vida, pela educação, pelos cuidados e tudo o mais que eles proporcionam; algo parecido à dívida de gratidão que cada pessoa tem para com Deus-Criador.
Em termos religiosos, isto é uma obrigação moral, é a devoção para com o seu próprio povo e o seu próprio país. Contra esta devoção, segundo moralistas católicos, peca-se através do nacionalismo exagerado, assim como comer exageradamente é pecado. Peca-se também através do racismo – que é odiar outros povos. Note-se bem que racismo não é a mesma coisa que nacionalismo. Nacionalismo é amar o seu próprio povo e tudo o que lhe pertence, porém respeitando os demais povos e o que lhes pertence. Contra a devoção nacional também peca-se através da omissão, da preguiça e da vergonha, como aqueles “que não querem nada com nada” ou que freqüentam a igreja mais próxima “porque tudo é a mesma coisa”, ou que têm preguiça de aprender ou então vergonha de falar a língua dos seus pais e antepassados.
Todas estas faltas são contra a lei natural, que manda cada um amar, sustentar e desenvolver o que lhe é próprio, porque é de sua responsabilidade, e respeitar tudo o que é dos outros, além de colaborar com eles quando necessário, para que eles também respeitem o que é dele, e colaborem com ele quando necessário.
A lei natural exige que cada um conserve o seu próprio rito; portanto, os ucranianos devem conservar o seu próprio rito ucraniano, e freqüentar a Igreja Ucraniana.
Por isto, ninguém, nenhum governo, país ou Igreja tem o direito de ignorar, menosprezar, desprezar, discriminar, ou, pior ainda, perseguir qualquer minoria étnica, impedindo-a de ter sua vida nacional e religiosa, própria e autônoma, já que a mesma é de sua única e exclusiva competência. De acordo com o direito natural, todas as etnias e minorias nacionais têm os mesmos direitos que as maiorias. Sobre esta séria questão de justiça, muito bem escreveu o Papa João XXIII em sua encíclica “Pacem in Terris”, dada a público em 11.04.1963: “…dentro de uma nação vivem não raro minorias de raça diferente e daí surgem graves problemas (§ 94). Deve-se declarar abertamente que é grave injustiça qualquer ação tendente a reprimir a energia vital de alguma minoria, e muito mais se tais maquinações intentem exterminá-la (§ 95). Pelo contrário, corresponde plenamente aos princípios da justiça que os governos procurem promover o desenvolvimento humano das minorias raciais, com medidas eficazes em favor da respectiva língua, cultura, tradições, recursos e empreendimentos econômicos (§ 96).”
Porque Deus o quer. – A lei natural faz parte da vontade de Deus. No entanto, a vontade de Deus não é só a lei natural.
Por exemplo, é por vontade de Deus que uma pessoa nasce num determinado rito, e não por vontade própria; portanto, rejeitar o seu próprio rito – é rejeitar a vontade de Deus.
Cristo disse ao jovem que O procurou perguntando o que fazer para ser salvo: “Se quiseres entrar na vida (eterna), observa os mandamentos” (Mt 19, 17). E o quarto mandamento de Deus diz: “Honra teu pai e tua mãe, para que vivas longos anos na terra que o Senhor teu Deus te dá” (Êx 20, 12). Conseqüentemente, quem quer agradar a Deus – deve honrar seu pai e sua mãe, respeitando, por conseguinte, tudo aquilo que lhes pertence.
Esta é a lei de Deus, que deve ser conhecida e respeitada por aqueles que se dizem filhos de Deus. Caso contrário, vale aquilo que Cristo afirmou em Jo 7, 49: “esta corja que ignora a Lei, são uns amaldiçoados!” No entanto, não podemos esquecer que a responsabilidade maior é dos líderes religiosos, que devem ser a “luz do mundo” (Mt 5, 14) e instruir o povo.
Por causa do exemplo de Cristo e dos Santos. – Jesus Cristo nasceu, viveu e morreu no Império Romano, cuja língua oficial era o latim. É por isto que colocaram a inscrição latina “Iesus Nazarenus Rex Iudaeorum” (INRI) em sua cruz. A cultura então dominante na região oriental do Império Romano era a grega; e por isto a inscrição na cruz de Cristo também estava em grego, além da língua local, o hebraico (Jo 19, 19-20). No entanto, Cristo viveu como judeu, falando e ensinando em sua própria língua.
O Novo Testamento da Bíblia começa mencionando a genealogia de Jesus Cristo, para provar que Ele era de fato o Messias descendente de Abraão (Gn 22, 18) e que pertencia ao povo judeu (Mt 1, 1-17). Se isto não fosse importante para Deus, não seria mencionado tão claramente e já no início do Novo Testamento.
Cristo amava o seu povo e lhe servia: “Não fui enviado senão para as ovelhas perdidas da casa de Israel” (Mt 15, 24). Perante uma mulher estrangeira, Cristo chegou a comparar os estrangeiros a cachorrinhos, com certeza não para desprezá-los, mas para deixar claro que em primeiro lugar vêm os filhos do seu próprio povo: “Não é conveniente tirar o pão dos filhos e atirá-lo aos cachorrinhos” (Mt 15, 26). Cristo sofria por causa do seu povo desobedecer a Deus e estar numa situação lamentável (Mt 23, 29-39; Lc 13, 34). E apesar do seu próprio povo não aceitá-lo e traí-lo, permaneceu fiel ao mesmo até a morte: “Veio para o que era seu, mas os seus não o receberam” (Jo 1, 11).
Maria, a Mãe de Cristo, também prezava o seu povo, conhecia e mantinha a sua identidade (Lc 1, 55), apesar de viver sob o domínio do Império Romano. Ela e São José cumpriam fielmente os preceitos do seu próprio rito religioso, e “todo ano na festa da Páscoa… iam a Jerusalém” (Lc 2, 41).
Outro grande exemplo de como se deve amar e servir a seu próprio povo, mesmo nascendo e vivendo toda a sua vida no estrangeiro – é Moisés. Paulo trata do assunto em sua epístola aos Hebreus 11, 23-27, onde também explica como conseguir forças para isto: “pela fé”.
O próprio São Paulo também é um grande exemplo. Ele distinguia claramente nacionalidade – pertença a um povo, de cidadania – pertença a um país. “No entanto, eu também poderia confiar na carne. Se há quem julgue ter motivos humanos para se gloriar, maiores ainda os possuo eu: circuncidado ao oitavo dia, da raça de Israel, da tribo de Benjamim, hebreu, filho de hebreus” (Fl 3, 4-5). Mas em Atos 22, 28, Paulo afirmou que era cidadão romano “de nascimento”. Afinal, Paulo era romano ou hebreu? – Na verdade, era tanto romano (cidadania) quanto hebreu (nacionalidade). Em outras palavras, Paulo era hebreu-romano, pertencia ao povo hebreu e ao país romano (primeiro o povo, pois é anterior ao país). Assim sendo, este autor é ucraíno-brasileiro, ou simplesmente – um ucraniano do Brasil, e se quiser ser honesto – deve prezar tanto a sua nacionalidade ucraniana quanto a sua cidadania brasileira. Pena que a legislação brasileira confunda estas coisas.
A verdadeira nacionalidade, – pertença a uma nação, a um povo, – não se define pelo local de nascimento, mas pelo sangue e pelos genes, pelos pais, pela cultura, pela língua e pelas crenças. Por exemplo, um filho de negros africanos que nascer no Brasil – não será tupi-guarani! Assim sendo, o local de nascimento de uma pessoa, como fator determinante de como ela será – é secundário. Já a cidadania, – pertença a um país, – é definida essencialmente pelo local de nascimento, podendo também ser comprada (como aquele tribuno, citado em At 22, 28, que comprou a cidadania romana), ou conseguida por concessão do governo do respectivo país – a assim chamada “naturalização”. A nacionalidade real é hereditária e imutável (só depende de Deus, que a escolhe; por exemplo: foi Deus Pai que escolheu para Cristo a nacionalidade judaica, foi Deus que escolheu para mim a nacionalidade ucraniana); já a cidadania – é adquirível e mutável (depende da pessoa, pode ser definida pela própria pessoa).
Porque a Igreja assim o quer. – A Igreja quer que cada um mantenha o seu próprio rio de origem. Vejamos agora as principais disposições da Igreja Católica sobre o assunto:
– “A intenção da Igreja Católica é que permaneçam salvas e íntegras as tradições de cada Igreja particular ou Rito” (Decreto “Orientalium Ecclesiarum”, do Concílio Vaticano II sobre as Igrejas Orientais Católicas, § 2).
– “Conhecer, venerar, conservar e fomentar o riquíssimo patrimônio litúrgico e espiritual dos Orientais é de máxima importância para guardar fielmente a plenitude da tradição cristã e realizar a reconciliação dos Cristãos Orientais e Ocidentais” (Decreto “Unitatis Redintegratio”, do Concílio Vaticano II sobre o Ecumenismo, § 15). É por isto que os católicos e os ortodoxos ucranianos devem deixar de lado todo e qualquer ressentimento e reaproximar-se, pois sem reaproximação – não haverá reconciliação, não haverá a reunificação tão desejada por Cristo.
Por respeito à Igreja da Ucrânia e aos nossos irmãos perseguidos. – Após a segunda guerra mundial, em 1945-46, Stálin liquidou a Igreja Ucraíno-Católica, aprisionando ou executando todos os seus bispos, muitos sacerdotes e religiosos, e milhares de fiéis, além de fechar as igrejas e proibir a prática religiosa, pública e privada. Mas nem por isto a Igreja Ucraíno-Católica deixou de existir. Apenas passou a funcionar na clandestinidade. Além disto, em 1946 foi promovido em Lviv um pseudo-sínodo que liquidou “oficialmente” a Igreja Ucraíno-Católica, incorporando-a à Igreja Ortodoxa Russa.
Consta que o líder da Igreja Ucraíno-Católica, Metropolita Ióssyf (José) Slipêi, foi convidado a ser Patriarca de Moscou, mas preferiu sofrer 18 anos de prisão e trabalhos forçados, a trair seu povo e sua Igreja. Assim sendo, ele foi preso em 11 de abril de 1945, tornando-se um mártir vivo. Permaneceu em cárceres soviéticos e campos de trabalhos forçados até sua libertação em 26 de janeiro de 1963, graças à intervenção do Papa João XXIII e do presidente americano John Kennedy, passando então a viver no Vaticano, de onde liderou a Igreja Ucraíno-Católica até 7 de setembro de 1984, quando faleceu aos 92 anos de idade. Até sua morte ele perseverou na luta pelos direitos da Igreja Ucraíno-Católica, especialmente para que o Concílio Vaticano II ou o Papa reconhecessem o Patriarcado Ucraíno-Católico, de acordo com o Decreto “Orientalium Ecclesiarum”, § 11. A Instituição Patriarcal, para uma Igreja Oriental, é sinônimo de independência administrativa.
Em memória de todos esses irmãos e irmãs lá da Ucrânia, e talvez até de nossos pais e outros parentes, que tanto sofreram ou até entregaram a vida em defesa da sua própria Igreja, mas foram fiéis até o fim – é que os ucraíno-católicos do Brasil também devem ser fiéis à sua Igreja! Na Ucrânia soviética eles eram perseguidos e não se entregaram, mesmo quando tiveram que sacrificar sua própria vida! Já aqui “na amada terra do Brasil” – os ucraíno-católicos são livres para manter e desenvolver a sua cultura, a sua língua, o seu rito e a sua Igreja, portanto, sejamos fiéis a tudo isto que o próprio Deus nos concedeu! Nós somos responsáveis por tudo isto! Assim sendo, não sejamos traidores de Deus, nem de nossos pais, de nosso povo, e de nossa Igreja!
A INCUMBÊNCIA DO CLERO UCRANIANO
Os Padres Basilianos, Redentoristas, Studitas e Salesianos, as Irmãs Servas de Maria Imaculada, as Basilianas, as da Sagrada Família, as de São José e outras, como também os membros do clero eparquial, isto é, diocesano – todos acompanharam os fiéis de rito ucraniano, em sua dispersão pelo mundo, para manter esses fiéis dentro da Igreja Ucraniana, e também para ajudá-los a manter a cultura e a língua ucraniana, sem o que o rito e a Igreja Ucraniana deixam de existir. A mesma incumbência têm as congregações e institutos religiosos ucranianos fundados na diáspora, como aqui no Brasil as Irmãs de Sant´Ana e as Catequistas do Coração de Jesus. Nenhum desses grupos foi trazido ao Brasil ou então aqui fundado com a finalidade de trabalhar entre os não-cristãos ou entre os fiéis de outro rito. Por vontade da Igreja de Cristo, e, portanto, por vontade do próprio Cristo, todas as nossas comunidades religiosas e também o clero eparquial (isto é, diocesano) têm a obrigação de permanecer num campo de trabalho bem definido: a Igreja Ucraniana de rito ucraniano. E como paralelamente eles também têm a obrigação de manter e divulgar a cultura e a língua ucraniana – eles devem primeiro conhecer profundamente a cultura ucraniana e saber se expressar fluentemente em ucraniano. O Decreto “Ad Gentes” sobre a atividade missionária da Igreja, do Concílio Vaticano II, diz o seguinte: “Qualquer um que se vai aproximar dalgum povo deve ter em grande estima seu patrimônio, línguas e costumes… Aprendam tão bem as línguas, que pronta e corretamente as possam usar. Assim terão mais fácil acesso à intimidade dos homens” (§ 26). O Concílio diz que qualquer estrangeiro que queira desenvolver um trabalho religioso no seio de outro povo – deve conhecer profundamente o patrimônio, a língua e os costumes desse povo. Assim sendo, qualquer religioso estrangeiro que pretenda trabalhar entre o povo ucraniano – deve conhecer profundamente e amar o nosso patrimônio, língua e costumes. Logicamente, os religiosos ucranianos devem conhecer e amar muito mais a sua própria cultura e a sua própria língua. Se não conhecerem nem amarem, como é que poderão trabalhar produtivamente para o bem do povo ucraniano, se não o amam, porque não conhecem e não amam a sua cultura e a sua língua?
O certo é seguir o conselho do príncipe dos poetas ucranianos, Tarás Chevtchenko:
“Aprendei o que é dos outros,
Mas não vos afasteis do que é próprio!
Porque quem esquece a sua mãe –
Por Deus será castigado!”
A INCUMBÊNCIA DOS FIÉIS DE RITO UCRANIANO
Só a cabeça não constitui um corpo. Só o clero não constitui uma Igreja. Por isto, os fiéis, os membros – são essenciais para a existência da Igreja, além, é claro, da estrutura, que une os membros à cabeça, permitindo que todo o conjunto funcione.
A função da cabeça, isto é, do clero – é liderar, organizar, fazer que o conjunto funcione. Só que o conjunto não vai funcionar sem a participação dos membros. E é aí que está a incumbência dos fiéis de rito ucraniano, para que o mesmo funcione, e para que a Igreja Ucraniana persista e se desenvolva aqui no Brasil.
Basicamente, a incumbência desses fiéis é a mesma que do clero ucraniano, principalmente na esfera que lhes é própria – a família. Se as famílias não forem ucranianas, elas jamais constituirão uma Igreja Ucraniana. Assim sendo, a verdadeira base da Igreja Ucraniana, a sustentação do rito ucraniano – é a família ucraniana. Por isto, é na família ucraniana que se deve criar o amor por todo o patrimônio, pela língua, pelo povo e pela Igreja Ucraniana. Só que não pode haver um verdadeiro amor sem o conhecimento. Ninguém ama o que não conhece! Sem o conhecimento, constante e progressivo – o amor vai definhar constante e progressivamente. Por causa disto, principalmente os casais ucranianos e os jovens que se preparam para o casamento – devem conhecer e aprender sempre mais sobre tudo o que se refere à vida do povo ucraniano, não só aqui no Brasil, mas em todas as partes do mundo, e principalmente na Ucrânia. (Vejam, por exemplo, o site oficial da Igreja Greco-Católica Ucraniana: www.ugcc.org.ua.)
No entanto, o amor também exige participação, porque quem não participa das atividades da vida – ou está morrendo, ou já está morto! Assim é o descendente de ucranianos que não conhece, não ama e não participa das coisas ucranianas. Para a comunidade ucraniana – é como se essa pessoa não existisse! E se a comunidade ucraniana, se a Igreja e o rito ucraniano dependessem dessa pessoa – também deixariam de existir!
Portanto, não sejamos os responsáveis pela morte do nosso povo e da nossa Igreja aqui no Brasil, ou de qualquer outro povo ou Igreja, caso o leitor não seja ucraniano, pois o que se refere aqui aos ucranianos – vale para os membros de qualquer povo ou Igreja, em relação àquilo que lhes é próprio.
Assim sendo, Amigo Leitor ou Amiga Leitora, lembre-se sempre que a sobrevivência e o desenvolvimento da sua família, do seu povo, do seu rito e da sua Igreja – dependem de Você! Que Deus o abençoe, a abençoe, e lhe ajude no cumprimento de suas responsabilidades!
Слава Богу!
Bibliografia
“Apresentado oficialmente pelo Santo Padre o Código de Cânones das Igrejas Orientais.” Semanário Católico Atualidade. Curitiba, 9 a 15 dez. 1990, p. 4-5.
Bíblia Sagrada. Petrópolis, RJ: Editora Vozes e Editora Santuário, 44ª ed.
Compêndio do Vaticano II. Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 1982.
Ekran (em ucr.), nº 138. Chicago, USA.
Grande Enciclopédia Larousse Cultural. Nova Cultural, 1998.
http://www.arquidiocese.org.br/paginas/jurisd3.htm – Acessado em 09 fev. 2007 – 00:54 h.
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http://www.nnavirai.com.br/acolitos/modules/ Evangelizando/liturgias.php – Acessado em 09 fev. 2007 – 00:52 h.
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Papa João XXIII. Encílica “Pacem in Terris”. 1963.
Pequeno Dicionário Enciclopédico Koogan Larousse. Rio de Janeiro: Editora Larousse do Brasil, 1980.